2005/10/31

Ainda sobre o referendo...

Resposta a um comentário (de Sem Palavras), no post abaixo.

Não! O Presidente actual foi eleito com, apenas, 26,8% dos votos dos eleitores. Teve 2 401 015 (dois milhões e quatrocentos mil votos) num total de 8 950 000 (oito milhões novecentos e cinquenta mil inscritos)...
Quem foi eleito com 29,3% foi o governo...
Quanto à questão do aborto devo esclarecer que eu sou contra o aborto. Acho que toda a gente é... até mesmo as pessoas que a ele recorrem...
Esta é, aliás, uma situação onde se concretiza, com as devidas adaptações, obviamente, aquela máxima de Bocage: "é castigo do vício o próprio vício", que se aplica a muitas outras situações da vida e que quase levou o autor à fogueira da inquisição...
Conheço um homem, casado, de pouca instrução, que dizia, de forma um tanto alarve, que era bem feito todas as mulheres que fazem abortos, morressem no acto...
Até ao dia em que teve de acompanhar a própria mulher, à parteira, para fazer um aborto.
Aprendeu a lição e esperou todo o tempo, com o coração nas mãos, temendo ser castigado e poder "comer do seu próprio veneno".
Entre pessoas civilizadas e intelectualmente evoluídas, não devia ser necessário provas tão duras para se ter um mínimo de dignidade social e honradez. Só gente muita malvada é que pode pensar que alguém faz aborto por malvadez.
O próprio acto (de fazer um aborto) é extremamente penalizador de quem o pratica. Só quem não entenda nada da condição humana, quem ainda não se libertou de sentimentos primários e bárbaros é que não compreende isso...
Porquê penalizar quem já está penalizado? A penalização é um acto de ignomínia. Até porque a sociedade não resolve, bem, nem os problemas das crianças e das mães que existem (e devia, e podia) porque é que se acha no direito de intervir numa coisa destas? Intervenha no que deve e lhe compete; isto é: nos problemas e respeito pelos direitos das pessoas que existem.
Mas não! Toda essa gente gosta é de coisas com que se possa CONJECTURAR, para usarem como desculpa para não fazerem NADA!
Além disso, isto é um assunto particular, no qual a sociedade não quer emiscuir-se. As leis são para penalizar actos criminosos que afectem a sociedade, não para satisfazer os instintos bárbaros e primários de alguns.
Quanto a crimes graves (e impunidades do sistema) há por aí muita coisa que objectivamente nos destrói, que devia mobilizar a justiça, as leis, e até os cidadãos (porque não referendar as penas a aplicar - e os prazos de prescrição dsos crimes - em casos de droga, de alta criminalidade, de criminalidade institucionalizada, de crimes praticados na exercício de cargos públicos?).
Se se punissem, devidamente, esses crimes não restaria tempo para andar atrás de mulheres que a vida sujeitou à "desgraça" de terem de fazer um aborto. E como a nossa situação política económica e social melhoraria.
Nisto como em tudo, há que ter em conta a opinião da maioria.
E, repito, a esmagadora maioria da população acha que isso é um assunto particular, não é crime que afecte a sociedade.
Isto tudo está bem expresso no resultado do referendo, com apenas 15% dos eleitores a concordarem com a actual lei.
Sem a legitimação da vontade da maioria, o governo e a justiça não têm legitimidade para molestar cidadãos, como o fazem nos casos de aborto, porque prevalecem as garantias dos direitos fundamentais individuais (que só devem ser molestados em nome do superior interesse da sociedade).
Mas neste país, essas garantias só se aplicam para proteger e garantir impunidade aos grandes criminosos, como o Franklin Lobo e todos os que lhe garantem protecção... Quem tiver dúvidas que faça referendos sobre as matérias que indico e verão a diferença...
Por isto tudo acho que se trata dum problema simples e fácil de resolver, que já devia ter sido resolvido, até porque o governo prometeu resolvê-lo. Acho que se devia acabar com esta novela vergonhosa, duma vez por todas, e tratar dos assuntos que são importantes para todos.
Digo que o Presidente está envolvido na conspiração porque foi ele que, logo após a eleição do governo, devolveu a proposta de convocação do referendo à Assembleia, decidindo-se pela sua não realização, com dois argumentos cretinos, como a realidade veio a confirmar. Digo que o P.M. está envolvido, porque me parece simples resolver o problema, mas o P.M. opta por alimentar uma polémica estéril, em vez de tratar dos assuntos sérios e importantes para todos, em vez de cumprir o conteúdo das promessas eleitorais... prende-se à letra dessas promessas...
Finalmente, digo que o T.C. está de conluio com esta conspiração (em tudo semelhante à gripe das aves, porque envolve meios e energias injustificados), porque nenhuma das argumentações com que o referendo foi chumbado tem fundamento:
(1) Não foi convocado qualquer referendo na presente legislatura; foi feita uma proposta ao presidente (o que não é, nem de perto nem de longe, a mesma coisa) tendo este decidido que o momento não era oportuno, pelo que deveria bastar que o Presidente mudasse de opinião acerca da oportunidade, para legitimar o acto; É óbvio que o princípio não se aplica neste caso, nem tem cabimento neste caso, porque se destina a prevenir a obstrução, sendo usado aqui, de forma perversa, para concretizar obstrução... à democracia e ao progresso do país. Como tudo, neste país desgraçado, nas mãos de "forças de bloqueio", que assim se servem das regras para violarem praticarem os desmandos que as regras pretendem prevenir...
É um absurdo que se considere que a duração da legislatura é diferente, apenas porque houve eleições, entretanto. Será que o ano civil também vai terminar apenas em Fevereiro, ou no final do próximo ano, apenas porque houve eleições? Preciso saber caramba! Ninguém percebe um argumento destes. É um sofisma (são dois, aliás) usado, abusivamente, pelo T.C., para imporem a sua própria opinião à sociedade e ao país, para perpetuarem a ignomínia que nos emporcalha a todos...
Até por isso o Presidente apenas consultou ao T.C. acerca da pergunta em si, não acerca da convocação do referendo.
Mas o T.C., cujos membros acham que podem participar na bandalheira de usar as suas funções para cometerem todo o tipo de atropelos à democracia, em nome das suas próprias opiniões e compadrios, cujos interesses assim pretendem impôr, de forma prepotente e abusiva, à população, decidiu emitir uma decisão descabida, despropositada, absurda e perversa.
Nas inúmeras violações, óbvias, evidentes e públicas, feitas à constituição, continuadamente, vitimando os cidadãos, o T.C. não sente necessidade de se manifestar.
É mais um caso do estilo: "branco é galinha o pôs!".
Por isso acho que é um caso que não tem que dividir os cidadãos, porque não se justifica o esforço. Ele (o esforço) é necessário para problemas mais importantes... Basta evoluir um pouco e aprender a respeitar a democracia para o assunto ser fácil e ficar resolvido.
Problemas resolvidos é que são bons e, via de regra, deixam de dividir a população, artificialmente...
Divide os cidadãos? Pois acabe-se com o problema e trate-se de coisas que "unam os cidadãos".