2005/11/20

É Tempo de Honrar os Mortos!

Com esta geração de políticos, será a Espanha capaz de se reconciliar com a verdade da sua história?
Que será capaz, eu não tenho dúvidas... Como também não tenho dúvidas de que Franco não permanecerá no seu mausoléu, para indignação e opróbio da memória dos povos.
O texto que se segue, é a tradução (livre) do texto publicado, por M&D, em Editorial, no original francês de Cécile Thibaud:

"Invocando o passado histórico, há encontros no bar onde se engendrou o golpe de estado, falhado, contra a jovem democracia espanhola quando, a 23 de Fevereiro de 1981, um punhado de oficiais, nostálgicos de Franco, sequestrava (fazia refém) o parlamento, na esperança de restabelecer um poder militar.
Mas Emílio Silva não veio falar disto. Há 4 anos fundou, com alguns amigos, a Associação para a recuperação da memória histórica, cuja vocação é ajudar as famílias dos «desaparecidos» durante a guerra civil a recuperar os corpos dos seus.

Quem eram os desaparecidos?
Todos aqueles de quem os franquistas se quiseram «desembaraçar», logo que entravam nas aldeias : os militantes socialistas ou comunistas, os sindicalistas, as figuras republicanas locais, ou os elementos das diferentes instituições, os professores, que fossem supostos «progressistas». Por vezes eram apenas os que sabiam ler e faziam a leitura pública do jornal… Não eram militares, mas civis, presos em suas casas ou nos locais de trabalho, vítimas de execuções sumárias.

Quantos são?
São, no mínimo, 30 000, se nos limitarmos às grandes valas comuns. Tendo em conta algumas histórias obtêm-se números muito mais elevados… A ideia dos franquistas era «agir depressa», impor o terror através da eliminação de todo e qualquer foco de resistência e submeter as populações, localidade a localidade, impondo-lhes as novas autoridades.
Recuperar estes números é difícil, porque não existem registos nem vestígios «oficiais» das múltiplas pequenas valas comuns, com 6 ou 8 cadáveres, como a de «Vadocondes» que foi encontrada graças a buscas persistentes dos parentes ou conhecidos ainda vivos. Constatou-se que existiram execuções sumárias em quase todas as localidades

Porquê remexer no passado, agora?
À partida, era uma história pessoal: procurava o rasto do meu avó, Emilio Silva, de cujo possuía o nome, professor na região de Leon, fusilado juntamente com outros 13 homens, a 16 de Outubro de 1936.
Quando a minha avó morreu, há 7 anos, quis enterrá-los juntos. Durante toda a sua vida, ela nos falou dele, da sua rectidão de carácter e da sua crença na causa republicana. E nós não sabíamos para onde o tinham atirado… Inquiri pessoas que o conheceram, de modo a reconstituir o que se passou… Quando contei a minha história num jornal local, muitas pessoas me contactaram para que as ajudasse a encontrar os seus parentes.

Porquê estas pessoas esperaram tanto tempo?
Por medo!
Depois da guerra, o regime franquista «honrou» os seus mortos e distribuiu indemnizações. As famílias dos republicanos «receberam» humilhações e represálias. Elas tiveram que se calar e viver, lado a lado, com os assassinos. A geração seguinte, a minha, quer refazer os traços da memória, sem ódio nem espírito de vingança.
Mas Franco morreu em 1975. A Constituição estabeleceu a democracia Espanhola em Dezembro de 1978…
Amnistia e reconciliação foram as palavras d’ordem da «transição democrática». Os partidos da esquerda pediram aos seus militantes que fossem generosos e que evitassem os «ajustes de contas». Isto é politicamente louvável. Mas as famílias é que pagaram o preço desta «doce» transição.
Portanto, a partir do fim dos anos 70, em inúmeras localidades, houve quem começasse a abrir as valas comuns, transportando os corpos para os cemitérios, colocando as placas comemorativas… As iniciativas familiares e locais passaram sob o silêncio das instâncias dirigentes dos partidos. Depois tudo parou com a tentativa de golpe de estado de 23 de Fevereiro de 1981.

Porquê?
Porque foi o momento em que se propagou a ideia de que o exército era uma instituição ainda frágil, e que era preferível não reavivar as «chamas» da guerra civil.

Não será macabro remexer em todos estes ossos?
Alguns pensam que é preferível deixar as coisas como estão ; outros acham que é imperdoável abandonar um ente querido que foi atirado, como um cão, para uma vala comum. Nós temos um dever de memória. É tempo de honrar os mortos, todos os mortos.
Imaginem os quatro presidentes da democracia inclinando-se diante das famílias… Nós devemos-lhes, no mínimo, isso.
Porquê o ditador «repousa» num mausoléu, enquanto que Manuel Azaña, Presidente da República que morreu no exílio, permanece no cemitério de Montauban?”
Comentário:
A isto chama-se: compactuar com os crimes do passado, ser cúmplice dos crimes do passado! Assumir responsabilidades nos crimes do passado!
Uma nação que não se liberta das sombras e dos ressentimentos provocados pelos seus criminosos, não pode ser livre nem democrática.
A história não perdoa e os povos também não! Porque o perdão, nestes casos, é traição à humanidade!
O mausoléu de Franco é uma afronta à humanidade e à memória dos que morreram, às suas mãos, lutando por nobres ideais, contra um facínora, como demonstrou ser, até ao fim dos seus dias...